Direito à existência, celebrar em resistência
Após dois anos de resistência e apoio mútuo, a Marcha do Orgulho LGBTI+ de Lisboa regressa à rua,
na sua 23ª edição. Entre uma pandemia, guerra na Europa, a destruição acelerada de políticas sociais
e a precarização e aumento constante do custo de vida, é mais importante que nunca reafirmar o direito
de toda a população a uma existência digna e celebrar em resistência as nossas lutas.
Reafirmamos o nosso direito à existência porque sempre foi posto em causa.
Hoje alinham-se novas e velhas forças reacionárias, não só da extrema-direita, para minar conquistas
dos movimentos feministas e LGBTI+. Confunde-se educação sexual com tentativas de condicionar a
orientação sexual ou identidade e expressão de género de crianças e jovens, quando isso é exatamente
o que faz o cisheterosexismo compulsivo e dominante.
Assistimos no movimento social a derivas conservadoras, de um “feminismo hegemónico” que nega a
história e a diversidade dos movimentos feministas e é abertamente transfóbico e essencialista de género.
Estes setores focam-se desproporcionalmente nas questões da destransição médica para ocultar a transfobia
e negar direitos e dignidade às pessoas trans. Apagam as nossas identidades e expressões de género
alternativas à norma cis-binária.
Também promovem o proibicionismo do trabalho sexual, são favoráveis à perseguição e criminalização des
trabalhadories do sexo. Procuram reduzir a diversidade de pessoas que fazem trabalho sexual a mulheres cis,
confundir os crimes de tráfico de pessoas e exploração sexual com o trabalho sexual prestado voluntariamente
entre adultes. Estamos com es trabalhadories do sexo na luta pela descriminalização do trabalho sexual. Somos
contra leis que criminalizem direta ou indiretamente formas de trabalho sexual e de o gerir. Reivindicamos o
reconhecimento dos direitos humanos, sociais e políticos de todes es trabalhadories do sexo, independentemente
do estatuto migratório. Denunciamos a política de “resgate” forçado e de repressão do trabalho sexual de rua da
Câmara Municipal de Lisboa, que viola os direitos humanos des trabalhadories do sexo.
Afirmamos o direito a uma existência digna para as pessoas com deficiência, que o capacitismo e a ausência de
políticas emancipatórias continuam a empurrar para a invisibilidade e para a institucionalização.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada por Portugal desde 2009, ainda não foi
cumprida. Exigimos medidas anticapacitistas que tenham em conta as nossas necessidades reais e nos devolvam
o poder de decidir sobre as nossas próprias vidas, cumprindo o lema da Vida Independente “Nada sobre nós sem
nós”.
A dessexualização dos nossos corpos e das nossas vidas é perpetuada e reproduzida por profissionais e sistemas
de saúde, privando-nos do acesso a cuidados de saúde sexual e reprodutiva. Entre outras: queremos o reforço
das respostas de Educação Inclusiva e acesso efetivo a todos os graus de Ensino e ao emprego. Queremos
acesso universal a serviços de assistência pessoal, financiada pelo Estado, e que seja uma profissão reconhecida
e regulamentada. Queremos acesso a assistência sexual para quem dela necessita para poder viver e
experienciar a sua sexualidade em pleno. Queremos o reforço do Estatuto do Cuidador Informal e a revisão do
sistema de avaliação de incapacidade, incluindo o acesso à reforma antecipada, a apoios sociais e a benefícios
fiscais reforçados. Exigimos financiamento para a adaptação e eliminação das barreiras arquitetónicas em
habitações e que se cumpram as leis sobre a sua eliminação em espaços públicos. O direito de todas as pessoas
à liberdade e à vida independente implica o acesso das pessoas com deficiência a serviços, a transportes
gratuitos e ao espaço público. Queremos o reforço da Educação bilíngue para alunes surdes e ensino de Língua
Gestual Portuguesa para todes es alunes. Queremos mais audiodescrição, legendagem e interpretação de
Língua Gestual em conteúdos audiovisuais. Não existem respostas para pessoas com deficiência perante
situações de violência. Exigimos a integração e a proteção de pessoas com deficiência no combate a todas
as formas de violência. Ainda lutamos pelo acesso aos nossos próprios corpos, desejos e direitos básicos.
Basta de políticas centradas no assistencialismo e na dependência: é tempo de mudar o paradigma e concretizar
a Vida Independente, permitindo-nos viver com as mesmas oportunidades e direitos que qualquer pessoa.
Somos pessoas inteiras, com valor intrínseco e inquestionável, não permitimos que a lógica produtivista
determine o valor das nossas vidas. A autodeterminação e o poder de decisão têm de passar para as nossas
mãos, como direitos humanos fundamentais que são!
Não esquecemos quem de nós vê o seu direito de ocupar o espaço público dificultado ou negado pela
inacessibilidade das ruas. Numa cidade onde tantas pessoas não têm forma de aceder a uma grande parte da
mesma, marchamos também por quem se encontra impedide de se juntar a nós!
Reiteramos o nosso direito a existir, porque carregamos na nossa luta o luto das 375 pessoas trans e de género
diverso assassinadas no ano passado. É uma pequena porção dos números reais, que continuam a crescer a
cada ano, com um aumento de 6% e 7% nos últimos 2 anos. Denunciamos a violência misógina destes crimes
de ódio, 96% dos quais contra mulheres trans e pessoas transfemininas. Nos Estados Unidos da América os
assassinatos duplicaram face a 2020 e o Brasil continua a ser o país onde mais pessoas trans são assassinadas,
um terço do total. São sempre as pessoas mais vulneráveis que mais sofrem com a transfobia - trabalhadories do
sexo, migrantes e pessoas racializadas, mas com Bolsonaro e o domínio de cidades inteiras pelo poder miliciano,
multiplicam-se casos de perseguição, tortura e exílio forçado de ativistas, em particular sindicalistas, indígenas,
negras e trans.
Falta cumprir o direito a ter onde existir ao faltarem espaços seguros, comunitários, recreativos e não comerciais
para mulheres, pessoas trans e pessoas não-binárias, como para as demais pessoas LGBTI+ e outros grupos
vulneráveis.
Celebramos em resistência, porque a polícia continua a ser um órgão reprodutor de violência contra mulheres,
pessoas trans e não-binárias e contra comunidades desfavorecidas, nomeadamente em tentativas de reportar
situações de violência.
Reivindicamos o direito a nomearmo-nos, porque ainda não é reconhecida a existência de pessoas não binárias,
por exclusão na insistência em marcadores de género binários e na escolha do nome limitada a listas
genderizadas. Exigimos o acesso a mudarmos o nosso nome sem termos que nos subjugar a padrões binários de
género.
Os sistemas informáticos dos serviços de saúde continuam sem suportar a alteração do nome e género atribuídos
à nascença, desrespeitando as identidades e tornando os cuidados de saúde em experiências dolorosas e
burocráticas. Falta transparência nos processos de transição, além da inconsistência nas exigências entre
hospitais.
Os cuidados de saúde das pessoas trans continuam centralizados, morosos e precários, deixando muitas delas
sem acesso ou dependentes de longas viagens. Recordamos as duas unidades de saúde especializadas
anunciadas, em Lisboa e no Algarve, que poderão ser o princípio duma solução. Faltam cuidados a nível nacional,
inexistentes nas Regiões Autónomas, e inacessíveis a quem vive longe dos grandes centros. É urgente agilizar o
acesso a terapia hormonal a pessoas migrantes, independentemente do estatuto migratório, e a pessoas em
situações acrescidas de vulnerabilidade.
Reivindicamos o direito a existir para as pessoas intersexo, cuja saúde e direitos continuam por abordar
devidamente, promover e respeitar. Em 2018, proibiram-se as cirurgias desnecessárias a crianças, mas nada está
a ser feito para trazer justiça às pessoas já sujeitas a estes procedimentos. Exigimos uma proteção eficaz dos
direitos das pessoas intersexo. Não basta proibir procedimentos invasivos em crianças e bebés, é necessário
respeitar a autodeterminação das pessoas intersexo em qualquer idade através de legislação antidiscriminatória
com base nas “caraterísticas sexuais”, independentemente da sua aparência ou configuração específica. É preciso
rever as classificações médicas que patologizam as pessoas intersexo. Faltam recursos e políticas para investigar
e abordar a discriminação e outras violações de direitos humanos das pessoas intersexo, com envolvimento das
próprias e das suas organizações na definição e avaliação de políticas. É preciso melhorar o aconselhamento
prestado às pessoas intersexo e sues cuidadories, são necessários programas de consciencialização pública e de
profissionais, e garantir o acesso das pessoas aos seus historiais médicos.
Celebramos resistindo, pois nem uma pandemia que expôs como nunca a precariedade e o desinvestimento
crónicos no SNS inverteu esse rumo. Continua-se a privilegiar o setor privado, comprometendo o acesso à saúde
e em particular o dos grupos mais vulneráveis, entre os quais as pessoas LGBTI+. É o que faz a Câmara
Municipal de Lisboa ao criar planos de saúde no privado para residentes carenciades com mais de 65 anos,
enquanto surgem denúncias de inscrições rejeitadas nos centros de saúde. Não precisamos de descontos na
saúde privada, mas sim de saúde pública e de um SNS eficiente que responda às necessidades diversas da
população.
Denunciamos também o precário acesso a cuidados de saúde para pessoas LGBTIQ+, pela falta de formação
de profissionais para atender pessoas trans e não-binárias, pessoas gays, lésbicas e bissexuais, pessoas
migrantes ou de comunidades racializadas, não considerando as especificidades de pessoas não brancas e não
heterocisnormativas.
Continuamos a ver os nossos direitos de saúde sexual e reprodutiva sob ataque.
A Procriação Medicamente Assistida já funcionava com recursos insuficientes. Agora, viu as suas listas de espera
agravadas com a pandemia, através da limitação da resposta em vários centros públicos. Exigimos investimento
integrado na melhoria do acesso e no aumento da resposta e da qualidade dos cuidados na PMA.
Profissionais de saúde continuam a discriminar-nos com base nas nossas orientações, independentemente de
existirem práticas sexuais de risco. Homens que fazem sexo com homens e pessoas não-monogâmicas são
colocadas em grupos de risco; pessoas lésbicas e pessoas com vulva são desencorajadas a testar para IST’s,
e pessoas em relações monogâmicas são automaticamente consideradas como não tendo práticas de risco.
Revolta-nos a discriminação latente na comunicação sobre o surto de vírus Monkeypox. Repudiamos a referência
feita pelo Presidente da Sociedade Portuguesa de Virologia como sendo uma “epidemia gay”. Indigna-nos que,
apesar de décadas de avanços científicos e ativismo em relação ao VIH, ainda persistem a serofobia e a
estigmatização da população LGBTI+, em particular de homens que têm sexo com homens. Estigmatização
veiculada pela comunicação social e profissionais de saúde, numa demonstração irresponsável de como não
se deve informar sobre temas de saúde pública. Assinalamos o cuidado da Direção-Geral de Saúde na
comunicação com organizações do movimento LGBTI+ e o trabalho conjunto no âmbito da prevenção - nada
sobre nós sem nós.
O acesso à PrEP continua restrito a uma minoria de utentes, limitado ao contexto hospitalar e excluindo as
entidades de base comunitária. O acesso à PEP continua limitado, enquanto persistem os julgamentos morais e a
quebra de sigilo profissional. As pessoas migrantes em situação irregular ou que não sejam titulares de
documento de direito que lhes confira igualdade de tratamento como pessoas beneficiárias do SNS continuam a
ter dificuldade no acesso a estas medidas de prevenção.
O fim do VIH continua refém da ausência de vontade política e de investimento público para uma política integrada
de prevenção e de combate à discriminação.
Celebramos a Marcha depois das medidas de proteção contra a covid-19 terem sido removidas na maioria dos
países ocidentais, que esquecem o contexto de pandemia assim que as situações nacionais melhoram. O acesso
dos países africanos à vacinação continua limitado e dependente das doações de países ricos que açambarcam
vacinas. As grandes farmacêuticas não abriram mão de patentes e tecnologias para permitir uma resposta rápida
nos países mais pobres, com consequências trágicas. Revolta-nos o “voltar à normalidade”, apenas focado na
economia e não nas pessoas. As falhas na vacinação global apenas potenciam mais mortes e doenças graves, a
evitar a todo o custo. Reivindicamos o direito a cuidados de saúde e uma distribuição justa de recursos,
mais importantes quando a pandemia afeta o acesso a todos os cuidados não relacionados com a covid-19.
Somos transfeministas e pelos feminismos plurais, somos mulheres, somos lésbicas, bisexuais ou pansexuais,
somos pessoas que sofrem com a misoginia e não podemos ser apagadas.
Denunciamos a ineficácia do combate à violência de género, que aumentou desde o início da pandemia.
Em Portugal, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima tem registado uma subida no número de casos de
violência de 113% desde 2016, com a violência doméstica a representar - em 2021 - 76,8% dos crimes. No entanto,
o financiamento, os meios e os mecanismos para prevenção e resposta à violência e proteção de sobreviventes
continuam insuficientes. A pandemia também aumentou a dupla jornada de trabalho, com o trabalho reprodutivo e
de cuidados a recair sobretudo sobre as mulheres.
Enquanto mulheres lésbicas somos alvo de discriminações e violências específicas, sofrendo assédio e lesbofobia
no emprego e dificuldades no acesso ao mercado de trabalho. Somos continuamente invisibilizadas e retiradas dos
lugares de representação e dos recursos, na sociedade e nos próprios movimentos LGBTI+ em que participamos.
Como mulheres lésbicas, a vivência da sexualidade feminina, em si já menosprezada, é-o duplamente ou mais
quando acumulamos outras identidades marginalizadas.
Exigimos o reconhecimento das especificidades e necessidades de saúde, das nossas sexualidades e realidades
de vida enquanto lésbicas. Afirmamos o direito pleno a constituir família, se desejado, sem que a nossa orientação
sexual seja mais um fator de discriminação, tanto em disputas jurídicas contra progenitores masculinos pela guarda
des nosses filhes, como em processos de Procriação Medicamente Assistida ou de adoção. Exigimos maior
comprometimento na visibilização das nossas vidas, reconhecimento dos nossos amores e famílias para podermos
estar e viver na sociedade de forma plena e feliz.
Existimos resistindo. O estado português continua em negação sistemática do racismo estrutural bloqueando o seu
combate. É urgente rever as políticas de memória histórica, desocultar o passado esclavagista e valorizar as
culturas de povos e grupos discriminados.
A legislação que combate o racismo é para lá de insuficiente e ineficaz. Atos graves e comuns são considerados
meras contra-ordenações. A recusa de fornecimento de bens, de venda ou arrendamento de casa, a recusa ou
limitação de acesso a cuidados de saúde e a locais públicos, incluindo escolas, deveriam ser crime de racismo.
A lei também exclui a difamação pública de pessoas ou grupos com base na sua origem nacional, racial e étnica, cor,
ascendência e território de origem.
O racismo não é opinião, é crime. O combate eficaz passa pela criminalização.
Continuam a faltar medidas legislativas e fiscalização para proteger os direitos laborais, incluindo de trabalhadories
informais, combater a precariedade e exploração laboral em setores maioritariamente ocupados por mulheres e com
um peso desproporcional de trabalhadories de comunidades racializadas.
Queremos a contratação de mediadories sócio-culturais em todas as áreas de serviço público, nomeadamente nas
escolas, nos hospitais, nos tribunais, na segurança social e nas prisões, bem como o fim das turmas segregadas, a
revisão descolonizadora dos currículos e manuais e o ensino bilíngue que inclua a língua materna. É urgente rever os
requisitos, inadequados e excludentes, de acesso às respostas de ensino da Língua Portuguesa.
Afirmamos o princípio do direito de solo para aquisição automática de nacionalidade portuguesa para quem nasça em
Portugal, independentemente do estatuto migratório des progenitories. Queremos a regularização de todas as pessoas
migrantes indocumentadas em Portugal, o reconhecimento da sua capacidade eleitoral e a concretização das quotas
de emprego e acesso ao Ensino Superior.
Basta de segregação económica, cultural e territorial das comunidades racializadas, que continuam a ser empurradas
para a periferia dos grandes centros urbanos e para a precariedade habitacional, de transportes, serviços, e outras.
Os despejos e demolições forçadas sem alternativas são violações de direitos humanos. Exigimos o fim da violência
policial, da criminalização e do sobrepoliciamento dos territórios onde habitamos. Queremos requalificação dos bairros,
melhoria das condições de vida e habitação digna para todas as pessoas. É necessário que as entidades estatais
recolham dados étnico-raciais para um diagnóstico das discriminações que fundamente políticas públicas de combate
à discriminação racial, como o Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação: insuficiente e desprovido dos
recursos adequados.
A pobreza energética e a precariedade que estas comunidades sofrem, especialmente as comunidades roma, resultam de
políticas segregacionistas. Não há justiça racial sem justiça económica e sem justiça climática.
Somos parte das comunidades brasileiras, afrodescendentes e outras na luta contra o racismo. Somos frente contra a
ciganofobia endémica e estrutural e o permanente assédio policial e da extrema-direita às comunidades roma.
Responsáveis policiais e polítiques continuam a negar o racismo estrutural e tratam as infiltrações da extrema-direita nas
forças de segurança e militares como “casos isolados”. Exigimos medidas de prevenção e combate a esta realidade e a
sua investigação exaustiva e independente.
Daniel Rodrigues, Danijoy Pontes, Miguel Cesteiro. Digamos os seus nomes. São inaceitáveis as condições prisionais que
continuam a causar a morte sistemática e evitável, se não induzida, de pessoas reclusas, e a opacidade do sistema
prisional face às mesmas e no geral. Exigimos a investigação independente das mortes nas prisões, onde a violência e os
maus-tratos são frequentes e afetam desproporcionalmente pessoas racializadas, mais ainda quando também são LGBTI+.
Celebramos também em resistência as nossas relações e famílias escolhidas, sempre empurradas para a margem do
reconhecimento social e legal quando não se baseiam em laços sanguíneos e de matrimónio. O modelo da família
nuclear é o único previsto legalmente, excluindo-nos de apoio estatal ou institucional e obrigando-nos a recorrer a ajuda
dentro das nossas comunidades já de si vulneráveis.
Rejeitamos o padrão incutido pela sociedade da relação monogâmica heterosexual e defendemos a liberdade e proteção legal
para estabelecer relações familiares e afetivas num conceito alargado, que inclua laços afetivos e relações não-monogâmicas.
O direito à existência também se aplica a crianças e adolescentes LGBTI+ - responsáveis de educação não podem ditar
o ensino que aquelas recebem e o seu bem-estar. É urgente um ensino e ambiente escolar acolhedores para estas crianças
frequentemente marginalizadas e ridicularizadas na escola, em risco de doença mental e suicídio. Exigimos a implementação
das medidas de proteção contra a discriminação previstas na lei do direito à autodeterminação de 2018. Destacamos a
necessidade de formação abrangente sobre temáticas LGBTI+ para quem trabalha em contexto escolar.
Continua por implementar o programa de educação sexual escolar, previsto na lei desde 1984. O tema deve ter um horário
próprio e ser lecionado de forma adequada aos vários ciclos de ensino. A negligência ou exclusão do mesmo são perigosas,
colocando em causa o desenvolvimento saudável das crianças e jovens num ambiente de compreensão e aceitação da diversidade
humana, a nível de características sexuais, sexualidade, identidade e expressão de género.
No ensino superior, confirmam-se centenas de denúncias de assédio e a manutenção de um ambiente abusivo, machista, racista e
LGBTIfóbico que afeta milhares de estudantes.
O ensino superior não pode continuar a ser um ambiente hostil, repleto de discriminação e preconceito.
As propinas continuam a ser um entrave a estudantes que queiram continuar os seus estudos, agravando a desigualdade entre classes.
Exigimos a propina zero.
Após a pandemia de Covid-19, a guerra na Ucrânia mergulhou a Europa no espetro da crise económica, do desemprego e da
austeridade sem fim com os salários a perderem poder de compra. Ouvimos falar cada vez mais das empresas unicórnios mas
ignoramos os unicórnios empurrados para a rua. Não faltam incentivos para as empresas, mas a crescente gentrificação da nossa
cidade deixa a sua população na rua. Grande parte da população LGBTI+ vive em precariedade e em risco de perder a sua casa.
Precisamos de uma cidade para as pessoas, não para as empresas!
Denunciamos a desconsideração institucional pelas nossas necessidades, lutas e vivências, e pelas nossas vozes.
Em Lisboa, o executivo da Câmara Municipal recusou-se a hastear a bandeira trans no Dia da Visibilidade Trans. A Vereadora do
pelouro dos Direitos Humanos e Sociais - Laurinda Alves - insistiu em desrespeitar o género de ativistas trans em reunião, e afirmou
não ver “classes, cores ou géneros”, negando as violências estruturais e sistemáticas que vivemos diariamente.
No Porto, a Câmara Municipal montou um mastro com uma bandeira arco-íris a pedido de associações comerciais após anos a ignorar
os repetidos pedidos da Marcha do Orgulho do Porto. Rejeitamos que o nosso reconhecimento e os nossos direitos só tenham atenção
institucional quando comercializáveis.
Celebramos os 40 anos da despenalização da homossexualidade e do “travestismo” no Código Penal, e exigimos a criminalização das
terapias de conversão da orientação sexual, que continuam a realizar-se impunemente em Portugal. Lamentamos os continuados vazios
legislativos na penalização e combate aos crimes de ódio, e o chumbo recente duma iniciativa legislativa para a implementação de políticas
públicas para o combate eficaz aos mesmos, incluindo o reforço dos mecanismos de acesso seguro à denúncia e de proteção das vítimas.
Assistimos ao desinvestimento contínuo nos setores públicos da Educação e da Saúde ou na proteção e na habitação sociais, enquanto o
custo das crises recai sempre sobre as pessoas contribuintes e os setores mais fragilizados. As pessoas em situações mais precárias pagam
o aumento da inflação, enquanto as grandes empresas fogem ao fisco e mantêm as margens de lucro intocadas.
Os atuais modelos produtivo e económico são incompatíveis com a minimização das alterações climáticas: dependem de combustíveis fósseis
e reproduzem desigualdades que minam as relações norte-sul. A devastação da fauna e da flora para implantar “desertos” de painéis solares ou
a extração de lítio para produzir baterias de veículos elétricos apesar das consequências desta mineração são falsas soluções “verdes”.
A contínua monetização das questões climáticas coloca em perigo a própria Humanidade. Precisamos de proteção social e proteção civil, de
florestas cuidadas e rios limpos. É por isso que a Marcha, com todas as suas cores, se quer a cada ano MELHOR E MAIS VERDE.